tag:blogger.com,1999:blog-95038382024-03-13T04:52:23.609+00:00Vale das SombrasCada palavra a sangue e dor marcada num grito de revolta silenciosa... Esta sou eu... A sombra, a noite... O nada.Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.comBlogger189125tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-38466577109092203622013-10-28T11:52:00.000+00:002013-10-28T11:52:03.402+00:00Ponto de FugaComo um traço de melodia em contraponto<br />
Invadida pelos fulgores de um compasso sanguíneo,<br />
Bailam os tambores de guerra ao ritmo da escuridão<br />
E, qual relâmpago de funérea alvura,<br />
Dança a espada na carne dos deserdados.<br />
<br />
Espectros de fogo revolvem as paredes do labirinto<br />
Correndo contra a perseguição da esfinge<br />
E, enquanto a noite se agita entre marés crepusculares<br />
Que ascendem em dedos de teia até ao manto das estrelas,<br />
Há um som de passos que correm na coreografia dos fugitivos,<br />
Agitando por dentro do escudo o ponto onde a seiva cai.<br />
<br />
Morta sob o peso da neve que lhe prende os braços,<br />
Chora em sinfonias dispersas o torso da árvore morta<br />
Que estende às trevas o abraço da súplica estrangulada<br />
Por entre o véu das correntes que lhe amordaçam os membros,<br />
E dorme sob um céu de fogos-fátuos em dispersão<br />
A clandestina memória de um andamento maior,<br />
Onde a voz da sinfonia se desvanece entre espelhos<br />
E cai como lágrima seca sobre o sudário do absurdo.<br />
<div>
<br /></div>
Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-1595847522709495842013-03-20T16:53:00.002+00:002013-03-20T16:53:42.934+00:00Fiel<br />
Só tu poderás dormir sobre a minha tumba<br />
Quando eu partir<br />
E o vento fustigar a lápide que me cobre<br />
Gemendo imitações de som.<br />
De sons, dos meus passos<br />
Sobre a terra húmida da aldeia serena<br />
E do teu saltar a quatro patas a meu lado,<br />
Como se estivesses ainda<br />
De olhar expectante no meu olhar perdido<br />
E não enroscado no mármore frio,<br />
Também à espera do fim.<br />
<br />
Só tu, quando os que passam te encontrarem<br />
E acariciarem com mãos indiferentes<br />
O teu manto gelado, como eu,<br />
Poderás falar de abismos que me engoliram<br />
E te deixaram para trás,<br />
Negro também, na alma e no coração,<br />
À espera de um eu que não pode<br />
Regressar.<br />
<br />
Só tu serás, então, o meu profeta,<br />
Para lhes lembrar que serão como eu<br />
E que o tempo passará, também, quando partires<br />
Para o abrir de meus braços na escuridão.<br />
Talvez, então, uma lágrima te embale<br />
E lave a pedra do derradeiro adeus,<br />
E, em ti, fiel a mim,<br />
Fiel a nós,<br />
Eles consigam ver outra verdade, outra<br />
Vida<br />
A pulsar nos seus corações de pedra.<br />
<br />
Só tu<br />
Serás o meu uivo de pena.<br />
Só eu serei<br />
O teu grito<br />
De amor.<br />
Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-38979832219072485152013-01-04T13:47:00.001+00:002013-01-04T13:47:10.225+00:00Infamous Last Words<br />
Diz-lhes que não há mais nada,<br />
Que acabou,<br />
Que já não há coração para salvar.<br />
Que o sangue fugiu em lágrimas pelo chão<br />
E eu também,<br />
Com palavras rasgadas no peito e a pele<br />
Rasgada pelas mesmas palavras.<br />
<br />
Diz-lhes que já não há séculos suficientes para viver<br />
Quando a memória não morre<br />
E que os olhos que viram a aurora dos milagres<br />
Fenecem, agora,<br />
A cada amanhecer um pouco mais.<br />
Diz<br />
Que a coragem não tem mais que estertores<br />
Para o fardo de demasiados anos<br />
Pousados sobre mim cedo demais.<br />
<br />
Diz-lhes que já não há<br />
Nem esperança nem essência nem futuro<br />
Nem vontade de o erguer<br />
Dos destroços de uma muralha perdida,<br />
Que a vida já não corre<br />
Nestas veias transidas de medo e de memória,<br />
Tão secas como eu.<br />
<br />
Mas não… Não vale a pena. Não digas<br />
Nada,<br />
Que nada é quanto escorre destas palavras<br />
Sem sentido nas frases para criar.<br />
Que as horas, essas<br />
Infinitas, as eternas, todas as horas<br />
Hão-de passar também sobre o meu rosto<br />
E até ele há-de ser nada no final.<br />
Para quê? Se os tempos correm abraçados<br />
À mesma sombra sempre repetida<br />
E as lágrimas podem ser para sempre novas,<br />
Mas têm os mesmos núcleos,<br />
Iguais.<br />
<br />
Não digas… Diz-lhes só que a sombra passa<br />
E o passado<br />
Fica pintado nos meus passos.<br />
O resto, eles que o vejam, se puderem, se<br />
Tiverem ainda olhos sobre o nada<br />
Que somos todos.<br />
Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-78615425853930422202012-09-07T13:15:00.001+01:002012-09-07T13:15:42.077+01:00Lições do Olhar<br />
Nasceu contemplando a espera dos abismos na distância<br />
E o sal dormia-lhe nas veias como um mar.<br />
Tinha nas mãos as manchas da negrura interior<br />
Que lhe repousava nas catacumbas da alma<br />
E a distância sentida na pele dos sonhos que fugiam<br />
No manto da eterna nulidade.<br />
<br />
Cresceu de olhos abertos ao vácuo da extinção<br />
Que a preenchia em profecias<br />
E os passos deixaram marcas na lama que amordaçava<br />
O canto que sufocava na solidão.<br />
<br />
Viveu com um olhar absorto sobre as palavras do vento<br />
E da água do mar que a convocava<br />
Aos altares do espectro cavernoso<br />
Cujas mãos lhe tocavam elegias no cabelo<br />
E deixavam para trás um suspiro de saudade<br />
Tão ténue como o crepúsculo dos cânticos mudos.<br />
<br />
Morreu, por fim, e os olhos ainda fitavam<br />
O deserto dos céus por sobre a vida.<br />
<div>
<br /></div>
Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-91138295798512673632012-07-13T14:13:00.001+01:002012-07-13T14:13:36.702+01:00Heresiarca<br />
Contemplo a fé do não ser<br />
Embalada sob o amplexo de névoas e de profecias<br />
E os braços da vela enlaçam o silêncio do meu corpo<br />
Como obstinações de cruz.<br />
Não creio,<br />
Mas tenho os olhos erguidos ao mistério do absoluto<br />
E os braços agitam as cordas rasgando a pele<br />
Nos pulsos do deserto moribundo.<br />
E há mãos de fogo na mordaça do meu grito,<br />
Da voz que nasceu em defesa dos exilados<br />
Mas que se perdeu no desterro<br />
E o tempo contempla as grades da essência que me condena<br />
Na perpétua prisão das chamas<br />
<br />
Roça-me os dedos a fuga do compasso de finados,<br />
A morte que apela ao vazio da minha imensidade<br />
E o adeus escapa-me sobre os dedos como voz de divindade<br />
Cujo apóstolo anuncia aos desertos<br />
O desvanecer das horas onde o sonho se dilui.<br />
<br />
Morreu em mim a defensora,<br />
A maga dos momentos que afastam o véu dos céus<br />
Ante a renúncia dos condenados,<br />
A fúnebre dispersão dos filhos do Éden<br />
Sobre o silêncio das águas,<br />
E tocam a rebate os sinos da catedral do absurdo<br />
Gritando ao poema deserto nos seus lábios mortos<br />
Que com ela morreu a redenção.<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-71429105712691426242012-06-29T11:30:00.000+01:002012-06-29T11:30:09.326+01:00Elegia<br />
Há um nome ancorado no tempo que completa a voz<br />
Como as veias de uma catedral,<br />
O silêncio que jorra por dentro das entranhas do mar<br />
E multiplica os ecos<br />
Até ao infinito som de um grito.<br />
<br />
Silentes, os olhos da aurora contemplam o véu<br />
Do horizonte em chamas,<br />
Rasgado pela fúnebre figura do cavaleiro arlequim,<br />
Da figura que regressa,<br />
Espezinhada pelos passos de uma divindade antiga,<br />
Prostrada pela profecia do futuro nada.<br />
<br />
A mão completa o sussurro da miragem perdida<br />
No olhar das esferas<br />
E o trono jaz entre as cinzas do império desfalecido,<br />
Como um segredo prostrado na conspiração das horas,<br />
Uma voz amordaçada<br />
Que se afasta entre muralhas destruídas<br />
Soltando ao vento o marulhar do caos.<br />
<br />
Há um lamento na trova dos deserdados.<br />
O rei morreu…<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-91804150968740865102012-06-22T11:57:00.001+01:002012-06-22T11:57:56.903+01:00De Profundis<br />
Invoco-te dos abismos da dor,<br />
De além da mágoa eterna, imensurável<br />
E espero-te nas trevas, vão senhor<br />
Do campo de batalha interminável.<br />
<br />
Exércitos, os teus, são só de amor,<br />
De sonho as lanças da noite indomável,<br />
De lágrimas o teu manto sem cor<br />
E de silêncio a esperança inefável.<br />
<br />
Invoco-te com mãos de alva saudade,<br />
Com olhos de vencida liberdade<br />
E com um coração feito de nada.<br />
<br />
Chamo-te da razão para sempre morta.<br />
Não passarás, senhor, à minha porta<br />
Para abençoar uma alma condenada?<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-69044026247091986062012-06-14T12:52:00.001+01:002012-06-14T12:53:20.328+01:00Ao Silêncio da Ideia<br />
Na hora em que todas as vozes se calaram<br />
Na pulsação da musa sob o sangue<br />
E os gritos da história que queria ser contada,<br />
Nem que apenas por mágoa, apenas<br />
Por fé,<br />
Surgiram vãos no abismo da procura<br />
A que só o silêncio respondeu…<br />
<br />
Quando o sussurro do sonho puxou das armas<br />
Por encontrar à espera as batalhas<br />
Em nome de cada palavra pronunciada,<br />
Quando a razão era de mãos apertadas na garganta<br />
Das aspirações secretas,<br />
Estranguladas sob a opressão das palavras<br />
De carrascos, de juízes, de carcereiros<br />
Sentados à espera de uma alma que pudessem<br />
Arruinar.<br />
<br />
Quando, mortas, as ânsias do imaginário<br />
Deram lugar a um tremor no vazio<br />
E a criação se fez fardo na essência do criador<br />
Temente à sombra e à mágoa e ao exílio e ao despertar,<br />
Quando uma voz sussurrante encheu as cavernas<br />
Da imensa ausência de um cárcere interior<br />
- Não era isto o que querias para o teu sonho… -<br />
E a noite imensa era treva igual ao dia<br />
E a eternidade a mesma saga repetida.<br />
<br />
Na hora em que os teus dedos se quedaram<br />
Sobre o papel manchado do teu sangue<br />
E das lágrimas vagas da tua alma,<br />
Quando o silêncio tomou posse do trono<br />
Que a soberana musa destronada<br />
Deixou ao vácuo que sobrou de ti.<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-47858946172487712152012-06-01T11:44:00.001+01:002012-06-01T11:44:15.577+01:00O Corpo do Olhar<br />
Este é o meu reino. Eu vejo<br />
Esferas no verde de cada floresta aberta<br />
Para me acolher no seu seio. Eu sinto<br />
O aroma das fantasias dispersas na alma<br />
De um corpo pintado a caruma e húmus<br />
No chão. Eu oiço os gemidos<br />
Das feras que divagam na penumbra<br />
Dos predadores. Eu toco a casca<br />
Dos troncos milenares que me cercam<br />
O corpo desorientado. Eu sinto o sabor<br />
Das eras que passaram sobre este campo<br />
Nos lábios febris de sonho. Eu sou…<br />
O que lembro e o que encontro<br />
E o que guardo dentro das casas destruídas<br />
Da minha alma e este lugar<br />
Que é meu, imensamente, eternamente,<br />
Vive comigo como a luz dentro de mim.<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-82930722469137110402012-05-25T13:28:00.001+01:002012-05-25T13:28:23.808+01:00Resignação<br />
Venho trazer-te o que é meu.<br />
<br />
Um violino onde a noite chora em cordas de diamante<br />
Planando sobre as arcadas de um profeta enlutado<br />
E um corvo que em silêncio fita as chamas devoradoras<br />
Dançando sobre as palavras que semeou sobre o papel.<br />
<br />
As portas do sangue ao corpo e à morte em mim.<br />
<br />
Venho estender no teu altar a toalha da minha pele<br />
Mutilada pelos cinzentos da resignação total<br />
De quem morre sob a sombra de uma rosa apodrecida<br />
Que foi verso abençoado por todas as cortes do céu<br />
Mas que morre entre as miragens de um olhar exilado.<br />
<br />
E o cântico à cruz onde dormem os meus braços<br />
Sangra dentro de mim como um gotejar de labirintos<br />
Por onde o sonho se esvai em carrilhões de loucura<br />
Traçados sobre a canção da pomba sacrificada.<br />
<br />
Venho deixar-te o que fui.<br />
<br />
Para que encontres no cadáver da entidade que voou<br />
O eco dos espelhos mortos na cintilação do absurdo<br />
E o sonho desvanecido em pétalas de renúncia<br />
Onde as lâminas compõem o macabro da sinfonia<br />
Que se estende ao compasso no final das minhas veias.<br />
<br />
Fechados os olhos da esperança à morte do ideal.<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-2142644064457010802012-05-18T11:17:00.001+01:002012-05-18T11:17:21.043+01:00Dispersão<br />
Passei,<br />
Qual etéreo murmúrio de tempos áureos<br />
Irremissivelmente mortos,<br />
Fantasma entre sombras de um mundo ausente,<br />
Ilusão de inalcançável esplendor.<br />
Fui mais uma entre os errantes da vida,<br />
Uma outra vagabunda do meu sonho,<br />
Sem abrigo nas ruas da saudade.<br />
Vivi como uma névoa dispersa<br />
Numa manhã mergulhada em brumas,<br />
Como um sopro de vento tempestuoso<br />
Tocando o corpo da rocha insensível.<br />
Andei por entre sendas de tristeza<br />
E nem a natureza me sentiu,<br />
Mas, no final,<br />
Ferida, triste e cansada,<br />
Fechei os olhos ao mundo em redor<br />
Para olhar o nada<br />
E dispersar na morte a minha dor.<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-21636062820654190442012-05-04T13:57:00.002+01:002012-05-04T13:57:27.289+01:00Grito<br />
Porque te escondes?<br />
A tua alma sangra de dor e de amargura<br />
E as tuas próprias lágrimas são de sangue,<br />
Mas, ainda assim, tua máscara indiferente<br />
É tudo o que permites que o mundo veja,<br />
Mero vislumbre de algo que não és,<br />
Falso espectro do mundo que tu vês.<br />
Porque não gritas?<br />
Se a tua revolta clama por vingança<br />
E a tua alma destruída anseia pela morte…<br />
Pára de fingir<br />
Que és a rocha que o mundo conhece,<br />
Quando o teu espírito estremece<br />
Ante a memória da dor.<br />
Grita!<br />
Deixa que vejam o que te fizeram,<br />
A torre de agonia que, dentro de ti, ergueram,<br />
O coração quebrado, ferido e torturado<br />
Que se fez sádico<br />
Para não sentir a memória do amor…<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-37187819894516039932012-04-27T13:59:00.002+01:002012-04-27T13:59:21.419+01:00Renúncia (I)<br />
Longe da vida vã, do amor magoado<br />
E do eterno silêncio de meus dias,<br />
Renuncio ao meu sonho destroçado<br />
E à memória das minhas fantasias.<br />
<br />
Renego a sombra das horas vazias<br />
E a escuridão do um mundo quebrado,<br />
Pois nada me prende às lembranças frias<br />
De uma alma abandonada no passado.<br />
<br />
Perdida da memória abandonada<br />
Que criou meus sonhos de alma quebrada,<br />
Rejeito até a mão da eternidade.<br />
<br />
Não voltarei a ter vida ou vontade,<br />
Pois, negada a minha própria verdade,<br />
Deixei de ser solidão para ser nada…<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-77664886164932439842012-04-20T14:42:00.001+01:002012-04-20T14:42:06.433+01:00Execução<br />
Ela veio, serena e decidida,<br />
Vencida<br />
Pelo desejo de vingança.<br />
Dentro de si, uma negra ânsia pulsava.<br />
O seu coração clamava<br />
Pelo sangue de quem lhe roubara a esperança.<br />
Os seus olhos eram como o gelo, frios,<br />
Vazios<br />
De sentimento ou de piedade.<br />
Não há misericórdia em peito morto,<br />
Nem conforto,<br />
Mas apenas a sua negra necessidade.<br />
<br />
Ela surgiu, sinistra e tenebrosa,<br />
Majestosa,<br />
Como a imagem de um anjo exterminador,<br />
Envolta em vestes de um negro soturno,<br />
Nocturno,<br />
Como o silêncio que envolvera a sua dor.<br />
Em seus lábios, um sorriso cruel<br />
Marcava o ódio fiel<br />
Que a acompanhava,<br />
Negro como a missão da sua alma torturada,<br />
Que, nas sombras do nada,<br />
Pelo julgamento supremo esperava.<br />
<br />
Soturna e indiferente, de alma morta,<br />
Atravessou a porta<br />
Da negra prisão onde aguardava<br />
A abjecta criatura responsável<br />
Pela dor interminável<br />
Que, há eras infinitas, a atormentava.<br />
A passos lentos, fria e indiferente,<br />
Surgiu, solenemente,<br />
Perante o réu do seu negro julgamento<br />
E, num sorriso de sádico prazer,<br />
Viu-o tremer<br />
Ante a iminência do último momento.<br />
<br />
Ela avançou para o seu corpo acorrentado,<br />
Pelo medo amordaçado,<br />
Fraco e imóvel ante a sua vontade.<br />
Sentiu a intensidade do seu medo<br />
E, em segredo,<br />
Amou esse instante de liberdade.<br />
Num gesto violento e revoltado,<br />
Ergueu o rosto quebrado<br />
Cujos olhos a fitavam com temor.<br />
Sentia que o seu corpo tremia<br />
E que esse estranho prazer diminuía<br />
O fantasma da sua própria dor.<br />
<br />
Em sádica provocação,<br />
Guiada mais por prazer que por razão,<br />
Aproximou-se do rosto vencido<br />
E, sentindo nele um temeroso desejo,<br />
Selou com um beijo<br />
O seu destino há muito decidido.<br />
Depois, ante o espanto perturbado<br />
Do condenado,<br />
Ela sorriu com sádica expressão,<br />
E, frio como o ódio que a dominava,<br />
Subitamente, um punhal brilhava,<br />
Na sua mão.<br />
<br />
Ela sentiu o medo incontrolável,<br />
Interminável,<br />
Da sua vítima há muito escolhida<br />
E um sinistro sorriso demonstrava,<br />
Enquanto observava<br />
A criatura que implorava pela vida.<br />
Depois, num gesto imperioso,<br />
Majestoso,<br />
Silêncio ao seu prisioneiro ordenou<br />
E, olhando nos seus olhos assustados,<br />
Pelo pavor subjugados,<br />
Deixou cair a máscara e falou.<br />
<br />
“Pensavas que podias enganar-me<br />
E abandonar-me,<br />
Para depois escapar com impunidade?<br />
Julgaste que eu jamais descobriria<br />
A fantasia<br />
Que me contaste como a mais pura verdade?<br />
Acreditaste que podias iludir-me<br />
E depois trair-me,<br />
Deixando apenas o silêncio em mim,<br />
Mas não! Estavas errado<br />
E és tu, hoje, quem está condenado<br />
Ao mais sinistro fim.”<br />
<br />
Ela aproximou-se, enquanto proferia<br />
A sentença sombria<br />
Que destinara à abjecta criatura<br />
Que, face ao medo da dor, da agonia,<br />
Implorava à mulher de pedra fria<br />
Que o poupasse à tortura.<br />
Ela, contudo, fria e indiferente,<br />
Deu um único passo em frente<br />
E sussurrou, ao ouvido do réu:<br />
“ Quero que sofras. Não terei piedade.<br />
Também não a tiveste, na verdade.<br />
Não tens fuga. És meu…”<br />
<br />
Num gesto lento, sádico, cuidado,<br />
Ela tocou o rosto perturbado<br />
Daquele que marcara para morrer<br />
E, enquanto sentia a sua agonia,<br />
Sorria,<br />
Preparada para o que decidira fazer.<br />
Subitamente, onde a mão repousara,<br />
O punhal passara,<br />
Deixando um rasto de sangue e de dor,<br />
E ele, sem saber o que sentia,<br />
Gritava de agonia<br />
E puro horror.<br />
<br />
Ela sorriu e um riso tenebroso,<br />
Misterioso,<br />
Ecoou no silêncio do lugar.<br />
Depois, num gesto de doce loucura,<br />
Bebeu, qual seiva escura,<br />
O sangue que corria sem parar.<br />
“Meu, até à última gota…”, sussurrava,<br />
Enquanto olhava<br />
O trémulo corpo do prisioneiro,<br />
Que, antecipando uma terrível agonia,<br />
Em silêncio, pedia<br />
À vida que o fizesse morrer primeiro.<br />
<br />
Um após outro, frios, premeditados,<br />
Traços marcados<br />
A sangue surgiam no corpo agonizante<br />
Daquele a quem ela entregara a vida,<br />
Para ser traída<br />
Pelo homem que escolhera como amante.<br />
Uma após outra, as horas decorreram,<br />
Mas não esmoreceram<br />
Os gritos da tortura infernal,<br />
Até que, satisfeita, extasiada,<br />
Ela fitou a massa destroçada<br />
Que restava do corpo do mortal.<br />
<br />
Ela observou-o, qual deusa indiferente,<br />
E, como um sorriso ausente,<br />
Fitou o seu rosto desfigurado,<br />
Onde corriam lágrimas dolorosas,<br />
Tenebrosas,<br />
Marcas de uma dor sem termo marcado.<br />
“ Não o mereces”, disse, impiedosa<br />
Como uma estátua silenciosa,<br />
“Mas decidi que vou mostrar clemência.<br />
Diz as tuas últimas preces,<br />
Mas se os deuses te derem o que mereces,<br />
Não encontrarás paz na inconsciência.”<br />
<br />
Por um momento, um silêncio sombrio,<br />
Sinistro e frio,<br />
Desceu entre a mulher e o condenado,<br />
Que, olhando a sua sádica executora,<br />
Via que a sua hora<br />
Havia, inevitavelmente, chegado.<br />
Depois, num gesto rápido e preciso,<br />
Nada indeciso,<br />
O último golpe do punhal desceu,<br />
Atravessando o peito torturado<br />
Do condenado<br />
Que, num último gemido, morreu.<br />
<br />
Ela sorriu, sinistra e tenebrosa,<br />
Misteriosa<br />
Como a noite de imensa escuridão,<br />
Sabendo que esse corpo destruído<br />
Talvez pudesse ter vivido<br />
Se lhe tivesse pedido perdão.<br />
E eis que parte, majestosa e serena,<br />
Sem pena,<br />
Remorso ou qualquer outro sentimento.<br />
Fica para trás a sua história morta.<br />
Há uma nova vida à sua porta,<br />
Um novo futuro… Um novo momento.<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-68876714305336816162012-04-13T14:00:00.002+01:002012-04-13T14:00:26.163+01:00Vermelho (II)<br />
Envolvo-me<br />
Entre vultos e cadáveres de passagem,<br />
Mais um corpo<br />
Entre a lascívia dos mortos.<br />
<br />
Fez-se orgia de sombra e tempestade<br />
A noite que vela os sentidos,<br />
Preenchendo o espaço<br />
Na aurora de um extático fulgor,<br />
Onde também eu sou corpo desumanizado<br />
A quem o delírio tornou humano.<br />
<br />
E os meus sentidos serpenteiam,<br />
Leves,<br />
Na etérea luxúria do ser ninguém,<br />
Como aves feitas de espadas sem rumo<br />
Rasgando os céus<br />
Em fulgurante majestade,<br />
E enrosco-me na trama dos dias,<br />
Suave abraço de soturno amante,<br />
Meu prisioneiro<br />
De sinistra morte sentida em mim.<br />
<br />
Penetra-me o pulsar das sensações<br />
Como uma fúria sem voz<br />
Aprisionada nos abismos do meu grito<br />
E o corpo arde em delírios<br />
De insuportável possessão,<br />
Quase como o sangue que jorra<br />
Mais forte<br />
Que todos os ecos que enchem o céu.<br />
<br />
Por isso,<br />
Deixo-me tocar<br />
Pelas perversas mãos dos anjos do destino<br />
E envolvo-me nos sons<br />
De uma vida que é já morte,<br />
Na sua lasciva contemplação de corpos,<br />
Mas que,<br />
Como futuro ainda por construir,<br />
Preenche com todas as luzes<br />
A negra noite universal do corpo intacto<br />
Que era meu,<br />
Mas que morreu.<br />
<br />
Enrosco-me entre fantasias<br />
E delirantes êxtases de ser,<br />
Mas, no silêncio da soturna infinitude,<br />
Nunca se apaga<br />
O eu do que perdi.<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-27102724726298503622012-03-29T15:37:00.002+01:002012-03-29T15:37:45.874+01:00Vermelho (I)<br />
Sangra-me os sentidos,<br />
Como se fosses noite devastada<br />
Invadindo os silêncios da minha imensidade,<br />
E toca-me a alma<br />
Como mil mãos que deslizassem<br />
Sobre o meu corpo de impenetrável torpor.<br />
Prende os meus gestos<br />
Na mística miragem do azul rasgado<br />
Dos teus olhos cegos<br />
E penetra no mais recôndito de mim,<br />
Qual luz de abismo<br />
Abandonada aos desertos do olhar.<br />
<br />
Sente-me<br />
Em cada grão da poeira de existir<br />
E encontra o meu espírito no teu corpo,<br />
Como uma voz que se envolve,<br />
Sem querer,<br />
Na suave sedução dos meus sentidos,<br />
Espelho de uma imagem sem reflexo<br />
Onde me vejo,<br />
Nua de alma e corpo devastado.<br />
<br />
Percorre-me<br />
No ausente labirinto dos meus olhos,<br />
Como lábios de morte<br />
Que me envolvessem no seu êxtase final,<br />
Fúnebre essência de um destino<br />
De eternamente anunciada morte,<br />
Prisão infinita de perene adiamento.<br />
<br />
Rasga-me as veias<br />
De onde se esvai o fluido dos meus sonhos<br />
E abre aos desertos nadas do meu nada<br />
O secreto sentido do meu ser,<br />
E beija o sangue que sai do meu corpo,<br />
Qual melodia de alma estilhaçada<br />
Feita de miríades de vidro<br />
E escuridão.<br />
<br />
Sangra-me cada sopro de vontade,<br />
Cada desejo de indefinição,<br />
Cada palavra que me brota da alma<br />
E se arrasta nas trevas do infinito…<br />
<br />
E leva,<br />
Na absoluta submissão do eterno nada,<br />
Aquilo que foi teu, porque roubaste,<br />
A rasgada paixão que condenaste…<br />
A minha redenção…<br />
…que profanaste.<br />
<div>
<br /></div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-10175201089598557772012-03-21T15:18:00.003+00:002012-03-21T15:19:26.872+00:00À Morte da Musa<div style="text-align: justify;">Para ti, que ousaste ter asas de fogo e voar até ao rubro sol da inspiração. Que semeaste universos com o ânimo de uma alma erguida ao alto e as mãos manchadas com uma tinta feita do teu próprio sangue. A ti, cujos sonhos o mundo desfez – se sonhos te atreveste a ter – e cuja inspiração desfaleceu nas correntes de uma palavra cruel. Tu que esperaste, mas que nunca acreditaste. Que quiseste, mas que nunca conseguiste… Esta é a tua última história.</div><div style="text-align: justify;">No princípio eras tu e não querias muito. Bastava-te um lugar, um olhar atento ao que de ti tinhas para partilhar. Querias somente ser. Ser a voz dos mil mundos que te habitavam, de outras vidas tão longínquas, mas tão tuas… Nasceste para o imaginário com um olhar abrangendo tudo o que querias contar. Mas as portas estavam fechadas e o mundo – o teu mundo – não sabia ser teu.</div><div style="text-align: justify;">Esqueceste, então, e seguiste pelo traçado de outros sonhos. Tudo falhou, mas tinhas ainda a força para voltar a tentar. Alimentava-te a esperança de ser, um dia, algo mais, mais que o fantasma de um ideal quebrado, mais que a luta vencida que todos rasgam, mas ninguém vê.</div><div style="text-align: justify;">Por mil anos de silêncios andaste por um mundo teu a que não pertencias. E, um dia, a luz da palavra nasceu. Um incentivo só bastou para te iluminar de esperança. Alguém via através das tuas sombras. Ainda estavas lá. Ousaste, então, sonhar mais uma vez e as almas que viviam dentro da tua desabrocharam em cantos e caminhos, aventuras e sonhos que eram, ainda e sempre, tu. Mais uma vez, ousaste ser perante o mundo. Mas o castigo não se fez esperar.</div><div style="text-align: justify;">Mãos erguidas clamaram pelo teu sangue. Ferozes gritos exigiram o teu silêncio. E tu, frágil reflexo de uma esperança, tentaste aguentar de pé os golpes com que te feriam, manter a tua voz aberta ao mundo. Mas não tinhas a força necessária – nunca a tiveste. Sangravas o sangue que te exigiam, mas, enquanto esperavas que parasse, já o silêncio se instalava em ti. Também tu conhecias o fracasso. Sabias não haver mais por que lutar.</div><div style="text-align: justify;">Voltaste, enfim, as costas a esse mundo onde o silêncio não bastava para sobreviver. Partiste, ciente de que abandonavas a melhor parte de ti, mas incapaz de continuar de pé ante feridas mortais. Longe era o teu lugar, longe de tudo… Só na renúncia poderias prosseguir. Da torre do sonho afastaste os teus passos para receber o beijo do fracasso. E morreste, por fim, para tudo o que te definia.</div><div style="text-align: justify;">Hoje, és o nada que sopra nos ventos do adeus, a despedida que nunca dissemos. A história jaz por terra e nós com ela. Fica-nos só o silêncio que aceitámos como mortalha para os desígnios do que fomos. O vazio. O abismo que em nós dilata pensamentos e murmura histórias que nunca poderemos partilhar. Hoje é isto que somos à luz da vida. E a vida… já não mora dentro de nós.</div><div style="text-align: justify;"> </div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-14842401211379016462012-03-08T15:23:00.001+00:002012-03-08T15:23:22.582+00:00Pegadas de FumoVulcânicos rubores passaram por esta estrada<br />
De sangue morto<br />
E as margens da última artéria transbordaram<br />
Para lá das muralhas da consciência.<br />
Secreto, o silêncio vogava pelas ondas do mar exangue,<br />
Deixando pegadas de fumo<br />
Sobre os ardentes mantos da aurora boreal.<br />
<br />
Longe, a fortuna cantou elegias ao espelho<br />
Da cegueira abençoada<br />
Com o veludo dos túmulos renascidos<br />
Onde a noite pintava cintilações de magia<br />
Sob o manto cruel do despertar.<br />
<br />
Solene, a estátua vigia a ruína esmorecida<br />
Nos ossos da catedral,<br />
Fantasmagórico olhar sobre o corpo do templo<br />
Que a si próprio se contempla.<br />
A fusão voltará a lavrar a hecatombe desses corpos<br />
Em ardente sacrifício<br />
E a lentidão dos compassos da última marcha<br />
Voltará a cantar a uma só voz.<br />
<br />
E, além do tempo, o grito dos morcegos<br />
Virá para derrubar as tempestades<br />
Na comunhão das muralhas de além-vida.<br />
<div><br />
</div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-41294314870140993512012-03-01T15:27:00.001+00:002012-03-01T15:27:59.371+00:00RegrasEstende as mãos ao amplexo do nevoeiro<br />
Que vela o soberbo rosto da sarça ardente<br />
Envelhecida por seiscentas encarnações.<br />
<br />
No silêncio das trevas que envolvem a mão do deus,<br />
Ele é a esfinge deitada no Sinai,<br />
O esboço esmorecido e suplicante<br />
Que se alonga até ao leito que consagra a divindade<br />
Na saturnina pele dos ancestrais.<br />
<br />
É como um grito<br />
O cosmos dos mandamentos traçados na sua voz<br />
De regras e transgressão.<br />
<br />
A mão da montanha que desce sobre as efígies<br />
Do povo exilado<br />
Onde ele é líder nas trevas e no porvir<br />
Do fogo que o investiu.<br />
<br />
A mãe que chora<br />
Nos olhos do apocalipse que se derrama<br />
Unge as cinzas da criação.<br />
<div><br />
</div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-78561906039029939112012-02-23T15:23:00.001+00:002012-02-23T15:23:10.555+00:00Comunhão de CorposIlustres desconhecidos,<br />
Galantes demónios fundidos na aurora do além<br />
E uma voz que grita na esfinge dos exilados<br />
A pergunta que procura a voz.<br />
<br />
Onde estás?<br />
Enquanto os corvos dispersam oráculos sobre o teu céu<br />
E o feitiço das trevas incendeia a tua morada,<br />
Enquanto a noite se dilata em espasmos enraivecidos<br />
E o silêncio te contempla na mordaça das tuas mãos?<br />
Onde te escondes, lorde protector,<br />
Quando as cinzas do futuro amaldiçoam o teu cabelo<br />
E a eucaristia dos mortos sem nome<br />
Se consuma na cruz da tua pútrida herança?<br />
<br />
Silêncio ao céu que responde<br />
Como um véu na consumação dos desejados<br />
Sobre a ruína do presságio que contempla a aurora<br />
No crepúsculo dos céus<br />
E o cântico que jorra nas veias do imaculados<br />
Em réplica à pena primordial.<br />
<br />
Estou no caminho do exílio que brotou na voz do abismo,<br />
Na libertação que prende mas não regenera,<br />
E o labirinto é um espelho pendente sobre o teu corpo,<br />
Mas eu já não sei que ausência divaga no meu destino<br />
E perdi-me do caminho para casa.<br />
<div><br />
</div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-69873789293638168212012-02-17T13:04:00.001+00:002012-02-17T13:04:07.796+00:00LiberatrixE se ela perdesse as flechas da voz distante<br />
E o sorriso dos silêncios<br />
Que dormiam na placidez da aurora<br />
Como anjos no rosário da eternidade?<br />
Se ela apagasse a poesia das horas completas<br />
E fugisse no vazio<br />
Para não voltar a estender os véus do regresso?<br />
E se ela esquecesse o altar onde foi sepultada<br />
E o nada lhe abraçasse a pele<br />
Como ondas de fogo embalando uma estátua de sal<br />
Com carícias olhando os filhos mortos<br />
Na noite das muralhas destroçadas<br />
Pelo cântico de mil soldados sem império?<br />
<br />
E se ela morresse na síntese do olvido?<br />
<br />
Se os seus lábios se calassem entre a bruma,<br />
Erguer-se-iam memórias dos túmulos esquecidos<br />
E corpos renasceriam de entre as ondas<br />
Para abraçar o murmúrio dos mistérios primordiais.<br />
Cantariam os mortos a memória do seu sangue<br />
Com hinos à austeridade do crepúsculo final.<br />
Sangrariam os dedos da noite em homenagem à hora<br />
Em que a mais divina entidade morrera<br />
E as manhãs desfaleceriam em miragens de eclipse.<br />
<br />
E se, ainda assim, o tempo não ouvisse<br />
E a vitória recusasse o calor do seu abraço<br />
Aos exilados de quem ela era rainha,<br />
Nasceriam então asas nas planícies desoladas<br />
E todas as vozes se dariam ao abismo<br />
Para ser, no nada, as armas do seu brasão…<br />
<div><br />
</div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-86247806206875528792012-02-10T15:20:00.001+00:002012-02-10T15:20:38.132+00:00DesafioPodes dizer ao mundo que não viste dignidade<br />
Nos traços da minha voz<br />
E falar-lhes de silêncios e palavras repetidas<br />
Que outros mil cantaram antes de mim.<br />
Podes erguer-te com a glória do fundamento secreto<br />
Que te apoia sem sequer saber que existes<br />
E invocar as regras da tua divindade<br />
Para crucificar cada imagem que um dia criei.<br />
Podes até invocar perante os altares da justiça<br />
O peso das minhas falhas,<br />
O sussurro vulnerável da minha consagração<br />
E contar que são memórias as fantasias que trago<br />
No sangue que me manchou a breve imagem<br />
De uma pureza para lá da redenção.<br />
<br />
O que não podes é calar o grito<br />
Que aflora ao sangue das minhas horas vãs<br />
E silenciar a vida que me invade<br />
Em cada madrugada de palavras.<br />
Podes dizer-lhes que eu não valho nada,<br />
Mas não podes parar a minha voz.<br />
<br />
Por isso vem! Invade o que quiseres<br />
E deixa que os teus actos glorifiquem<br />
O nome que tu não tens,<br />
Que a censura que instalaste proclame a insanidade<br />
Da tirania que pretendes em ti.<br />
<br />
Mas ouve e sabe que o tempo não morre<br />
E que os deuses verão nascer o dia<br />
Em que o meu nome estará no fim da terra,<br />
Talvez frio,<br />
Talvez morto de renúncia,<br />
Mas capaz de prender nos céus do imenso<br />
A certa glória de não ser como tu.<br />
<div><br />
</div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-41180203801801668062012-02-03T11:07:00.001+00:002012-02-03T11:07:59.692+00:00Finis DierumApaga o meu nome da história deste mundo.<br />
Eu nunca fui ninguém<br />
E as asas que quebraram contra o chão do labirinto<br />
Nunca foram senão vagos implantes<br />
Num corpo que nem sequer era meu.<br />
<br />
Nos séculos que passaram sobre a bruma,<br />
Nem as palavras puderam salvar-me<br />
Da vulnerabilidade de um sangue demasiado fraco,<br />
De um nome feito desilusão,<br />
Do silêncio que fui.<br />
Ninguém pôde encontrar traços de império<br />
Na mordaça estilhaçada<br />
Que era afinal um grito moribundo<br />
Na renúncia da figura enjeitada em mim.<br />
<br />
Por isso esquece…<br />
Não dês mais tempo a alguém que não merece<br />
Nem os escassos segundos da contemplação de um sonho.<br />
Apaga as horas que o meu corpo percorreu nessa estrada<br />
E deixa que o fim desperte<br />
Como quem nunca viveu.<br />
<br />
Exílio, seja… eu mesma renuncio<br />
A todas as ambições que nunca pude equilibrar,<br />
Código que nunca pude cumprir.<br />
Seja apenas a lama a envolver-me os sentidos,<br />
Meu breve apocalipse prometido<br />
Onde nada permite a redenção.<br />
<div><br />
</div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-72017089126456222332012-01-24T15:20:00.002+00:002012-01-24T15:20:09.119+00:00DefesaOlha. Bem sei que pensas<br />
Que nos teus braços repousa o leito da perfeição,<br />
Que és a única voz digna do espanto dos povos<br />
E que trazes nas palavras a dignificação do ser.<br />
Sei que queres ser o látego dos miseráveis,<br />
Apagar da face da terra quem ousou viver o sonho,<br />
Mas que, por ecos ou obras delirantes,<br />
Vê bem onde tu vês insanidade.<br />
<br />
Eu sei que outras palavras te repugnam,<br />
Que ofensas plantaste para as destruir.<br />
Vi cair mais que os que tu poderias<br />
Conter na torrente do teu julgamento.<br />
<br />
Olha! Eu sou a defesa dos vencidos,<br />
Do sonho que mataste com a tua palavra<br />
E acuso a tua sombra!<br />
<br />
Serei a redenção dos que quebraste,<br />
Abrigo para a magia que mutilaste,<br />
Protectorado dos sonhos sem voz.<br />
E tu?<br />
Continua, se queres, a destilar amargura<br />
Na sombra das lições primordiais,<br />
A lançar ofensas sobre os vencidos<br />
Como se fosses o mestre supremo.<br />
<br />
Tu não sabes…<br />
Nem todos querem a imortalidade.<br />
Apenas alguns momentos de luz…<br />
<div><br />
</div>Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-9503838.post-63603265335797166032012-01-09T15:01:00.002+00:002012-01-09T15:01:47.281+00:00Sangue de OráculoEsta é a hora<br />
Onde os silêncios se incendeiam<br />
E a profecia proclama entre cinzas e quimeras<br />
O nome dos que morreram entre nós.<br />
<br />
Herança<br />
No palpitar do fogo que consome<br />
A aurora dos oráculos distantes<br />
Que foram ancestrais de cada imagem<br />
E progénie das almas<br />
Que florescem ainda em cada traço<br />
Da palavra.<br />
<br />
A nossa voz,<br />
O espelho que estrangula o sopro da renúncia<br />
E o pensamento<br />
Nas marés que levaram para o abismo<br />
O turbilhão do tempo.<br />
<br />
O adeus, por fim,<br />
À pena erguida em louvor à memória<br />
E o estilhaçar de todos os destinos<br />
No grito do melhor que se perdeu.Carla Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/12543241113417693312noreply@blogger.com1