Friday, September 29, 2006

Indiferença

Não me importa que a vida passe adiante,
Sem sequer me sentir ou observar.
Também eu sinto a vida mais distante
Que tudo quanto um dia soube amar.

Não me importa, se a morte me levar
Para longe desta agonia constante,
E apenas no alto céu me libertar,
Mais uma estrela no céu cintilante.

Não interessa que este instante dormente
Se continue, sempre, eternamente,
Até onde se desvanece o ser.

Se a vida quer partir, boa viagem!
Não me interessa mais esta miragem!
Já não importa! Não quero saber!

Chuva

13/09/2006

Cai,
Gélida e cruel, sobre o meu corpo morto,
Arrastando consigo as memórias do passado
E as esperanças de um futuro que nunca virá.
Molha o meu corpo e foge com a minha alma,
Levando, entre o sangue e a lama,
As cinzas do meu espírito vencido.

Fria e impiedosa, cai sobre o meu corpo,
Para arrefecer o meu corpo ainda morno
E cortar o calor do meu sangue.
Cai, para me sepultar num túmulo molhado,
Oculto aos olhos dos homens,
Escondido dos filhos do mundo,
Guardado pela mente de Deus.

Cai sobre mim, suave e pesarosa,
Como se os próprios céus chorassem a minha morte
E a natureza me lamentasse.
Inunda o mundo que me rodeia,
Desfazendo em água a história da minha vida
E os traços incompreensíveis da minha alma.

E o mundo passa, frio e indiferente,
Sem compreender que a chuva, que os molha,
Que inunda as suas vidas
E que percorre o seu mundo,
É a mensageira da minha memória,
A protectora dos meus sonhos perdidos,
A voz da minha alma destruída,
Morta na aurora da inocência,
Silenciada
Pela crueldade do mundo.

O mundo passa,
Mas não compreende
Que, ao aniquilar o meu corpo,
Me preserva consigo para sempre.

Cai, carinhosa e doce, sobre o meu corpo morto,
E leva nos seus braços a minha alma,
A mensagem da inocência destruída...

O mundo que passe...
Os homens que esqueçam...
A natureza lembrará para sempre!

Mortalitas


10/09/2006

Deusa negra da loucura e do sono infinito,
Que caminhas pelas estradas do mundo,
Arrastando atrás de ti
O sopro de vida dos teus escolhidos,
Indiferente a todos os pedidos de mais tempo
E a quaisquer súplicas por misericórdia...

Senhora sombria do nada eterno,
Que governas a vida para além da vida,
O infinito vazio
Que se segue à existência...

Morte, que passas entre os homens,
Detém os teus passos
E, por um momento,
Dirige para mim o teu olhar vazio.

Enquanto outros te pedem que os poupes,
Eu estou aqui e peço-te que me leves!
Enquanto os homens te imploram mais um dia de vida,
Eu peço-te: nem mais um instante!
Enquanto eles te pedem
Que os deixes viver o que ainda não viveram,
Eu imploro-te,
Ajoelhada perante a tua grandiosa presença,
Que não me obrigues a suportar mais um segundo
Daquilo que vivi.

Eles pedem-te a vida,
O futuro.
Eu peço-te o descanso, o eterno nada,
A morte.
Contudo, quando passas,
Nem te dignas dirigir-me um breve olhar.

Porque me negas?
Se eu te venero, se te adoro...
Se te peço que olhes para mim?
Porque me recusas a tua paz?

Se eles te pedem mais um dia de vida,
Se não entendem como é belo o que prometes,
Então deixa-os ficar, por mais um dia,
Na futilidade da sua vida inútil,
E leva-me a mim,
Que te espero,
Que te quero,
Que te desejo!

Leva-me nas tuas asas de noite
E deixa-me flutuar no vazio!

Deusa negra, amada senhora,
Toda-poderosa morte,
Deixa-os ficar,
Porque eles não sabem como és bela!

Deixa-os, por um momento,
E aceita-me.
Leva-me contigo,
Porque te amo como eles nunca saberão!

Olha para mim...
Estende-me os teus braços...

Leva-me contigo para o infinito!

Tuesday, September 05, 2006

Amo-te

26/08/2006

Amo-te
Com toda a loucura do desespero,
Com toda a angústia de quem sabe que só tem um dia para viver.

Amo-te,
E a minha alma moribunda
Grita o teu nome por entre o estertor da agonia,
Pedindo para te ver.

A meus olhos, és a mais bela obra do criador,
A perfeição presa num corpo mortal.
És tudo aquilo com que eu sempre sonhei,
O amigo que sempre quis ter do meu lado,
O amante que desejei,
O companheiro que idealizei nos meus sonhos.

És igual a mim...
Os teus ideais de vida são os meus.
Tens a mesma forma de ver as coisas mais misteriosas,
Aquele fascínio pelas trevas que o mundo não consegue entender.
Queres apenas viver a vida e ser feliz... como eu.
És igual a mim...
A tua alma é igual à minha
E o teu coração bate no mesmo compasso.

És como eu...

Mas eu,
Que digo que te amo,
Sinto que não te sei amar como mereces.
Eu, que te quero,
Sei que serás mais feliz com outra que não eu.
Eu, que te desejo com todas as minhas forças,
Vejo que nunca encontrarás em mim a felicidade
E desisto de lutar por ti.

Deixo-te partir,
Porque vejo que mereces mais que a minha alma destruída,
Que o meu coração ferido e torturado pelo passado.
Deixo-te,
Porque sei que mereces mais que um amor limitado,
Definido pela indiferença face à vida e o desprezo face ao mundo.
Deixo-te,
Porque sinto que ficarás melhor protegido por outros braços
E, se tu estiveres bem,
Então nada mais interessa.

Vai em paz...
Vai com a certeza de que o meu coração será teu eternamente,
Mas que não será em mim que descobrirás a felicidade.
Vai,
Porque é meu desejo que corras para o teu futuro
E não que fiques, como esta alma quase morta,
Preso ao passado.

Vai... Eu deixo-te partir...
Porque te desejo... E desejo que encontres a felicidade...
Porque te quero... E quero que tenhas a alegria que não te posso dar.
Porque te amo...

...E, por isso, liberto-te.

Destruída


24/08/2006

Quebraste-me,
Como a um barco perdido contra os rochedos da costa,
Como um frágil ramo de árvore que se estendia para o sol,
Como um corpo despedaçado no fundo de um profundo abismo.

Quebraste-me...

Mais impiedoso que o negro anjo da morte,
Desceste sobre mim e lançaste-me na dor.
Reduziste a cinzas os meus antigos sonhos
E abandonaste-me ao vazio da minha vida destroçada.

Quebraste-me,
Com a mesma indiferença com que olhas um monte de lixo,
Com a mesma facilidade com que caminhas a cada dia,
Com a mesma irresponsabilidade com que sempre agiste.

Quebraste-me...

Olhaste para mim e nem sequer me reconheceste,
A mim, alma concebida por ti.
Rejeitaste-me, com um olhar de repulsa,
Como se eu não fosse senão um verme repugnante
Que merece ser pisado.
Abandonaste-me, na aurora da vida,
Para morrer longe de tudo quanto amei.

Quebraste-me...

Quebraste a minha alma
Com a ignorância dos teus actos irresponsáveis.
Cravaste no meu coração
O punhal da tua indiferença e falta de amor.
Transformaste o meu corpo
Num destroço abandonado à fome e à morte.

Deixaste-me no mais estéril deserto,
Para morrer, quebrada e destruída.
Negaste-me toda a esperança de felicidade,
Mas proibiste-me o refúgio de uma morte piedosa.
Abandonaste-me, sozinha neste mundo cruel,
Para viver, para sempre, nas sombras
Do desgosto e da tristeza.

Recusaste-me, depois de morta e destruída,
Caída dos meus sonhos,
E deixaste-me apodrecer em vida,
Para não ouvires de mim
A acusação que ainda assombra o teu espírito,
Que nunca te deixará...

Quebraste-me!

Sempre, Eternamente...

Sempre serena, alma de um sonho antigo,
Que esperavas durar eternamente,
Choras sozinha, à falta de um amigo
Que apague em ti essa dor permanente.

Silenciosa, quase inconsciente,
Indiferente à dor, ao medo e ao perigo,
Lamentas o sofrimento presente
Que todo o mundo abandonou contigo.

Sempre serena, imóvel, impassível,
Observando a barreira intransponível
Que te afasta de tudo quanto amaste.

Calma, como se o tempo não passasse,
Como se a eternidade te deixasse
Esquecer a vida que um dia sonhaste!

Filho da Noite

Meu doce anjo, memória desta vida,
Em meu nome caído da inocência,
Dorme na luz da tua inconsciência,
Que eu velarei tua alma destruída.

Filho da noite, da noite perdida
Da angústia sem socorro ou assistência,
Fecha os olhos e deixa a consciência
Fugir de ti para a minha alma esquecida.

Meu pequenino, luz dos meus momentos,
Dorme, que eu velarei teus sentimentos,
E deixa-te embalar pela doce luz.

E, se a morte te chamar em segredo,
Abre os teus braços e não tenhas medo,
Que eu ficarei para suportar tua cruz!

Sacríficio

Arrastei-me entre as sombras do passado
Durante anos de dor e de agonia,
Pedindo aos deuses da noite sombria
Que essa dor redimisse o teu pecado.

Sofri a angústia de um corpo magoado,
De uma alma ferida, para sempre vazia,
Dando o sacrifício de cada dia
Para que pudesses ser libertado.

Durante mais anos que a eternidade,
Renunciei à minha liberdade
E em mim tomei tua dor, fria e serena.

Mas, cansada, levanto-me da lama,
E, erguendo os braços ao céu que me chama,
Entendo que, por ti, não vale a pena!

Ancestral

Com toda a devoção que era devida
À tua suposta superioridade,
Respeitei tua presença e tua vontade
E dediquei-te toda a minha vida.

Como a uma divindade enaltecida,
Adorei-te, na imensa eternidade,
E vi em ti a perfeita verdade
Da antiga sabedoria esquecida.

Representavas, meu antepassado,
Uma força superior, um legado
De alta sabedoria incontestada.

E eu, cega por aquilo que sentia,
Pus em ti toda a esperança de alegria
E amei-te, mas tu não valias nada!

Campo de Lamentos

Ainda choro a infância destruída
Em que todos os sonhos se apagaram,
Perdidos nas memórias que ficaram,
Incapazes de dar sentido à vida.

Ainda lamento a criança perdida
Na solidão das trevas que restaram,
Dos sonhos vãos, que outros ventos levaram
Para longe da esperança destruída.

Ainda magoa a memória sombria
Daquele grito de vida vazia,
Lançado, em desespero, aos quatro ventos.

Eu sou a inocente condenada,
Que se arrasta, ferida e destroçada,
Entre as cinzas de um campo de lamentos!

Semper Tuam

Fugiu no vento o afecto que te dei.
O amor que te tinha, a mágoa levou.
Tudo o que quis, o meu tempo, apagou.
Arderam os sonhos que imaginei.

Perderam-se as forças com que te amei.
A minha vida, o ódio a destroçou.
Meu ser morreu. Meu coração quebrou.
Desfez-se em cinzas tudo o que sonhei.

Hoje sou só uma sombra vazia,
Espectro vazio de uma vida sombria,
Cinza perdida, varrida para a rua.

Mas se, um dia, o meu sonho renascer
E o fogo que morreu voltar a arder,
Garanto que essa chama há-de ser tua!

Thursday, June 01, 2006

Rainha dos Caídos

Num vestido de trevas envolvida,
Escondida na distância de um olhar,
Por entre as sombras da noite perdida,
Chora, sozinha, quem não sabe amar.

Perdida numa vida sem lugar,
Marcada pela esperança destruída,
Chora, perdida, sem poder parar,
Abandonada na aurora da vida.

Perdida num olhar de angústia fria,
Sorriso triste de uma alma vazia,
Chora, vencida, rainha dos caídos.

Num sudário de noite mergulhada,
Chora, para sempre, a vida destroçada,
Alma morta, mas viva entre os vencidos!

Será Como Quiseres

Se quiseres que caia, será cumprido.
Diz-me que morra e acontecerá.
Diz que deixe esta vida sem sentido
E como tu quiseres se fará.

Não é nada que eu não deseje já...
Partir deste infinito destruído
Onde, sem pensar, te deixei perdido,
Abandonado à mágoa fria e má.

Se quiseres que me perca, que me esqueça,
Ou, simplesmente, que desapareça,
Ordena, pois será como quiseres.

Mas, longe de ti, não peças que viva,
Pois nesta vida esquecida e furtiva,
Não há luz longe de onde tu estiveres!

Memento Mori

Na sombra eterna da noite sem fim,
Como um fantasma negro e inconstante,
Deste mundo soturna caminhante,
Nessa noite, a morte passou por mim.

Com um sussurro leve, de cetim,
Voltou para mim o seu olhar brilhante
E, num sorriso vazio e distante,
Mostrou-me que futuro via em mim.

Mostrou-me anos e anos de existência
Num mundo sem piedade ou inocência.
Mostrou-me uma vida inteira a sofrer.

“Mas tem fé, – disse – porque o tempo passa!
E, por mais forte que seja a desgraça,
Lembra-te de que um dia hás-de morrer!”

Miragens e Ilusões

Espectros de luz e sombras sem sentidos,
Miragens de um passado abandonado,
Fantasmas de segredos destruídos,
Ilusões de um futuro inacabado...

Espíritos mortos de um mundo apagado,
Almas sem dono, corações vencidos,
Vultos de dor, de tormentos errados,
Ecos de angústia, espíritos perdidos.

Sombras que sangram na noite sombria,
Onde antes brilhou, pura, a luz do dia.
Uivos de morte e lamentos de dor.

Assim é feito o mundo! Assim a vida
Caminha, por entre as sombras perdida,
Num mundo sem magia e sem amor!

Alma

Alma minha que, dentro de mim, gritas,
Que te esvais em constante sofrimento,
Porque te revoltas? Porque te agitas?
Qual é a causa do teu desalento?

Alma, que cantas tão triste lamento
Que as sombras da dor se tornam malditas,
Porque é que é tão negro o teu sentimento?
Que se prolonga em horas infinitas...

Porque é que a cada hora, a cada instante,
Sinto a angústia do teu choro incessante,
A tortura da angústia que te prende?

Porque, depois de marcada e vencida,
Pediste piedade aos filhos da vida,
Para ver que ninguém te compreende!

Tonight We Die

Chegou, amado, a nossa última hora,
O eterno adeus à vida e à agonia.
Acabou a nossa esperança vazia,
Para que o nosso sonho se cumpra agora.

Em nosso nome, nenhuma alma chora.
Ninguém fica que nos recorde um dia.
É tempo pois, e a nossa fantasia,
Neste momento, não mais se demora.

Chegou, amado, o momento esperado,
Em que todo o sofrimento é negado
E, juntos, perdoamos todo o mal.

Morremos esta noite, meu amado,
Deixando à vida um sonho destroçado
E a força desta decisão final!

Friday, May 05, 2006

Irmãos de Sangue

Na vida, fomos almas consagradas,
Uma só força em dois corpos iguais.
Fomos um só, irmãos espirituais,
Divina ligação de almas sagradas.

Num mundo de almas amaldiçoadas,
Fomos eco das vozes celestiais.
Fomos a luz das almas imortais,
A pureza e a paz abençoadas.

Fomos o amor, a eterna majestade,
A perfeição da pura eternidade,
Um raio de luz na noite perdida.

E hoje que o nosso tempo acabou,
Somos, no mundo que nos condenou,
Irmãos na morte, tal como na vida!

Último Sacrifício

De joelhos no chão, rosto escondido,
Olhos cerrados de intensa agonia,
Um vulto negro na luz fugidia
Lamenta a sua vida sem sentido.

Expressão sombria, voz de anjo caído,
Alma sem sonho, amor ou fantasia,
Aguarda o cair da noite vazia,
Vida vencida num mundo perdido.

Ergue o olhar aos céus, no gesto cego
De quem jamais teve algum aconchego
E grita para os céus celestiais:

“Aceita, Deus, este último tributo!
Tu, que me deste uma vida de luto,
Recebe agora os meus gritos finais!”

Antes do Amanhecer

Na noite eterna de um mundo vazio,
Em pesadelos de agonia e dor,
Vagueia a minha mente, em vão furor,
Lutando contra a dor e contra o frio.

Dor infinita... A vida por um fio...
Gritos, gemidos, lágrimas, horror...
Morte eterna... Medo devastador...
Orações mudas para um céu vazio...

Tortura eterna de um sono maldito,
Perdido por entre um espaço infinito
De sofrimento e sonhos sem sentido.

Acalma o teu temor, alma perdida,
Porque prometo hoje que a tua vida
Antes do amanhecer terá partido!

Canto de Amor Perdido

Caminhante de penumbra e de treva,
Para onde vais? Perdido em pensamento...
Quem choras, neste antro de desalento?
Quem és? Que imensa dor em ti se eleva!

Quero saber quem és! Talvez não deva...
Tortura-me a dor do teu sentimento!
És jovem, ainda! A vida é um momento!
Quem lamentas, nos túmulos de treva?

“Amada – dizes – porque me deixaste?
Que força te levou a que saltasses
Para o nada em que te despedaçaste?”

Então, vejo em mim preso o teu olhar
E sinto que, por muito que implorasses,
Força alguma me faria voltar!

Luz do Mundo

Senhor, sei que me esqueci que existias,
Que fingi desconhecer a tua vida.
Sei que te abandonei, cega e vencida,
Quando eras tu a esperança de meus dias.

Escolhi caminhos vãos, falsas magias.
Longe de ti, deixei-me ser perdida.
Afastei-me da tua luz querida
Em troca de ilusórias fantasias.

Deixei-me vencer e dei-me ao profundo.
Afastei-me de ti, luz do meu mundo
E abandonei-me ao nada sem sentido.

Senhor, sei que me mantive afastada,
Mas peço-te, hoje: salva-me do Nada!
Toma de volta o teu anjo caído!

Dorme...

Na aurora da tua vida, destroçado
Em sofrimento e dor... e nada mais,
Dorme, meu anjo, nas horas fatais
Que te derrubaram, abandonado.

Caído da inocência, amaldiçoado
Por crimes de outros tempos ancestrais,
Dorme, meu filho... Não... Não sofras mais.
Mais um momento e terá terminado.

Vencido por uma vida sem dono,
Destruído e condenado ao abandono,
Dorme, meu anjo, na noite inclemente.

Fecha os olhos e o céu estará contigo!
Acalma a tua dor, meu querido amigo
E dorme em meus braços, eternamente!

Era Uma Vez...

Era uma vez, num antigo momento,
A beleza de um sonho que foi meu.
Brilhava, como a luz de um sentimento.
Sorria, até que a beleza morreu.

Era uma vez um belo pensamento,
Beleza eterna de um eterno céu.
Voava, livre, nas asas do vento.
Sonhava, até que o sonho se perdeu.

Era uma vez um espírito inocente,
Brilhante na beleza da sua mente,
Bela, até que a sua mágoa apareceu.

Era uma vez... Morreu hoje a inocência!
Pois, na mágoa e na dor da consciência,
Caiu ferido o anjo que era eu!

Auto-retrato

Alma sombria, triste e misteriosa,
Entre pequenos rasgos de loucura.
Por vezes maldita, por vezes pura...
Reflexo de uma vida tenebrosa.

Sorriso triste de alma pesarosa.
Olhar doce de infinita ternura.
Às vezes certa, às vezes insegura...
Imagem de uma dor silenciosa.

Olhar perdido entre a melancolia
Dos sonhos, da vida e da fantasia...
Expressão de um anjo caído do céu.

Reflexo triste do eterno abandono,
Como folha caída de um Outono...
Eis o quadro daquilo que sou eu!

Prece Macabra

Mostra-me os sonhos da vida apagada,
Deus negro de toda a esperança perdida.
Faz-me sentir minha alma abandonada
E reviver a dor de ser esquecida.

Tortura-me com a imagem destroçada
De toda uma existência destruída.
Mostra-me o horror da vida inacabada
Onde a miséria me deixou vencida.

Faz-me sentir de novo angustiada,
Pelo decorrer dos dias torturada
E em sofrimento eterno enlouquecida.

Torna-me cega ao mundo, amaldiçoada
Pela dor, e pelo ódio derrotada,
E, depois, põe um fim à minha vida!

Abismo

Vazio imenso de um sonho vencido,
Olho para além da tua eternidade,
Promessa de esquecimento e vontade,
Fim dos tempos de um sonho destruído.

Observo os teus confins onde, perdido,
Vagueia o espírito da minha idade.
No teu eco, sereno e sem maldade,
O meu nome é mil vezes repetido.

Abismo eterno, aceita-me em teus braços!
Quebra na tua sombra os negros laços
Que me prendem, e deixa-me fugir!

Porque toda a minha existência é negra,
Mas, mesmo assim, esta vida não quebra!
Abismo eterno, deixa-me cair!

Rosa

Flor do silêncio, espelho da coragem,
Alma serena na noite da vida,
Sorri para o mundo, mesmo se, perdida,
Não vês nada senão uma miragem.

Flor da vida, da mais perfeita imagem,
Reflexo de uma esperança destruída,
Ama a liberdade, mesmo vencida,
Mesmo que os sonhos estejam de passagem.

Flor da memória, imagem do futuro,
Mesmo que vivas caída no escuro,
Mantém a esperança de um dia melhor.

Ergue-te da noite, para a nova luz!
O tempo apagará a tua cruz!
A vida apagará o teu amor...

Súplica

De onde me vês, caída e miserável,
Podes olhar e não sentir piedade?
Condenada para além da eternidade,
A um mundo de miséria interminável.

Podes permanecer inabalável
Perante tão grande acto de maldade?
Abandonada à minha insanidade,
Perdida numa dor insuportável.

Como podes ser surdo ao meu lamento,
Súplica de dor e de desalento?
Como consegues ser tão inclemente?

Olha para mim! Olha a minha agonia!
Olhando a minha dor a cada dia,
Deus! Podes permanecer indiferente?

Ars Moriendi

Rasga os canais que me mantêm erguida,
E flui, vida, para fora do meu ser!
Cai no nada em que me quero perder
E vence minha esperança destruída!

Mostra ao mundo o que é viver esquecida
No abismo da vontade de morrer!
Sai de mim, força que me fez mover
E põe, enfim, um fim à minha vida!

Rasga de mim cada ínfima estrutura
E faz com que eu caia na noite escura
Do abismo de uma alma que não sente.

Faz-me cair e aplaude o meu destino!
Anuncia ao mundo aquilo que ensino:
Permanece para sempre inconsciente!

Sirius

Pela eterna adversidade da vida,
Apagou-se o teu brilho de alegria.
Esvaiu-se em noite a tua luz esquecida.
Em mágoa se extinguiu tua magia.

Viveste sempre uma luta sombria,
Aprisionado, sem culpa, sem vida.
Perdeste-te numa luta vazia,
Por quem a tua força foi vencida.

Perdido numa vida fria e nua,
Numa guerra eterna que não é tua,
Crês que os sonhos pertencem ao passado.

Mas os teus olhos brilham de saudade,
Recordando a tua antiga liberdade,
Perdida, para sempre, sem pecado!

Enlouqueceste?

Com que serenidade me anuncias
Os sentimentos que vivem em ti!
Dizes que vives os melhores dos dias,
Que amas, finalmente, alguém aqui.

Enlouqueceste? Ainda não esqueci
As palavras amargas que dizias,
As lágrimas, que tanta vez colhi,
A derrota das tuas fantasias.

Dizes que desta vez será diferente,
Que o amor viverá eternamente,
Que ele é o anjo que sempre quiseste.

Pois digo-te eu que, se, neste momento,
Crês na ilusão desse teu sentimento,
É certo que, em verdade, enlouqueceste!

Messias Arrependido

Olhos cerrados numa muda prece,
Braços abertos para o infinito...
Caído em terra, onde a vida se esquece,
Lábios cerrados, prendendo seu grito.

Lágrimas enchem seu rosto contrito.
No seu coração, a agonia cresce.
Em si, tomou tudo o que era maldito,
Mas é sempre de dor a sua prece.

Por séculos e séculos nascido,
Viveu para redimir o pecado
E por ele morreu, na dor calada.

A agonia é demais! Arrependido,
Vive a sua revolta, abandonado
Numa missão para sempre falhada!

Errado

Quando me escondi do mundo magoado
Em que vivias, chamando por mim,
Quando fugi para o nada sem fim,
Deixando-te ficar abandonado.

Quando te deixei, triste e destroçado,
Gritando o meu nome, em ânsias sem fim,
Abri os olhos e entendi, enfim,
Que todo o meu projecto estava errado.

Quando te deixei por uma quimera
E, a teus olhos, me esqueci de quem era
Os meus passos levavam-me para o Nada.

Mas, hoje, que a tua dor me iluminou
E, do mal que fiz, vi o que ficou,
Sei: toda a minha vida foi errada!

Vencidos da Vida

Profundo, eterno, meu anjo vencido,
No teu olhar encontro a minha dor.
Fomos vencidos, em nome do amor,
Por um desejo maior destruído.

Sereno e doce, meu anjo caído,
Memória antiga de um sonho maior,
Ardo na chama de um sonho sem cor,
Sonho do teu paraíso perdido.

Anjo caído, memória perdida,
Não somos mais que vencidos da vida,
Sonhos sem dono, corações partidos.

Eu, sonhos mortos... Tu, asas quebradas!
Sejamos, entre ilusões derrotadas,
A última memória dos caídos!

Cobardia

A olhar nos meus olhos, disseste, um dia,
Com voz serena de total certeza,
Que, por mais forte que fosse a tristeza,
Pôr fim à vida era uma cobardia.

Disseste que, por mais que a noite fria
Me envolvesse num manto de incerteza,
Seria um acto de imensa fraqueza
Não enfrentar a dor que me angustia.

A olhar para mim, com um sorriso triste,
Disseste que a felicidade existe,
Escondida no mais profundo de mim.

Mas, sozinha na vida que me deste,
Vejo que estava errado o que disseste!
Cobardia foi não chegar ao fim!

Profecia

Um dia há-de vir em que o teu pecado
Te pesará demais para suportares,
E pedirás àqueles que encontrares
Perdão para a escuridão do teu passado.

Um dia há-de vir em que, abandonado,
Enlouquecido pelos teus pesares,
Pedirás ao deus em que acreditares
Que volte a redimir o teu pecado.

Um dia há-de vir em que a tua loucura
Se converterá na maior tortura
E implorarás um segundo de bem.

Mas ouve! Eu sou a voz dos torturados
E, por quantos deixaste abandonados,
Te garanto: não haverá ninguém!

In Memoriam...

Hoje, o mundo contempla a tua glória,
Observando o auge do teu esplendor.
Por ti, toda a vida hoje sente amor,
E celebra, alegre, a tua memória.

Hoje, o mundo reconhece a tua história,
Aclama-te e adora-te em furor.
Mas quantos deles viram quanta dor
Te custou a tua breve vitória?

Hoje, os homens celebram a alegria,
A memória da tua fantasia,
Mas saberão que demónios te assaltam?

Senhora eterna entre os anjos caídos,
Hoje se erguem teus sonhos destruídos.
Mas onde estão aqueles que te faltam?