Friday, April 13, 2012

Vermelho (II)


Envolvo-me
Entre vultos e cadáveres de passagem,
Mais um corpo
Entre a lascívia dos mortos.

Fez-se orgia de sombra e tempestade
A noite que vela os sentidos,
Preenchendo o espaço
Na aurora de um extático fulgor,
Onde também eu sou corpo desumanizado
A quem o delírio tornou humano.

E os meus sentidos serpenteiam,
Leves,
Na etérea luxúria do ser ninguém,
Como aves feitas de espadas sem rumo
Rasgando os céus
Em fulgurante majestade,
E enrosco-me na trama dos dias,
Suave abraço de soturno amante,
Meu prisioneiro
De sinistra morte sentida em mim.

Penetra-me o pulsar das sensações
Como uma fúria sem voz
Aprisionada nos abismos do meu grito
E o corpo arde em delírios
De insuportável possessão,
Quase como o sangue que jorra
Mais forte
Que todos os ecos que enchem o céu.

Por isso,
Deixo-me tocar
Pelas perversas mãos dos anjos do destino
E envolvo-me nos sons
De uma vida que é já morte,
Na sua lasciva contemplação de corpos,
Mas que,
Como futuro ainda por construir,
Preenche com todas as luzes
A negra noite universal do corpo intacto
Que era meu,
Mas que morreu.

Enrosco-me entre fantasias
E delirantes êxtases de ser,
Mas, no silêncio da soturna infinitude,
Nunca se apaga
O eu do que perdi.

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