Friday, September 29, 2006

Indiferença

Não me importa que a vida passe adiante,
Sem sequer me sentir ou observar.
Também eu sinto a vida mais distante
Que tudo quanto um dia soube amar.

Não me importa, se a morte me levar
Para longe desta agonia constante,
E apenas no alto céu me libertar,
Mais uma estrela no céu cintilante.

Não interessa que este instante dormente
Se continue, sempre, eternamente,
Até onde se desvanece o ser.

Se a vida quer partir, boa viagem!
Não me interessa mais esta miragem!
Já não importa! Não quero saber!

Chuva

13/09/2006

Cai,
Gélida e cruel, sobre o meu corpo morto,
Arrastando consigo as memórias do passado
E as esperanças de um futuro que nunca virá.
Molha o meu corpo e foge com a minha alma,
Levando, entre o sangue e a lama,
As cinzas do meu espírito vencido.

Fria e impiedosa, cai sobre o meu corpo,
Para arrefecer o meu corpo ainda morno
E cortar o calor do meu sangue.
Cai, para me sepultar num túmulo molhado,
Oculto aos olhos dos homens,
Escondido dos filhos do mundo,
Guardado pela mente de Deus.

Cai sobre mim, suave e pesarosa,
Como se os próprios céus chorassem a minha morte
E a natureza me lamentasse.
Inunda o mundo que me rodeia,
Desfazendo em água a história da minha vida
E os traços incompreensíveis da minha alma.

E o mundo passa, frio e indiferente,
Sem compreender que a chuva, que os molha,
Que inunda as suas vidas
E que percorre o seu mundo,
É a mensageira da minha memória,
A protectora dos meus sonhos perdidos,
A voz da minha alma destruída,
Morta na aurora da inocência,
Silenciada
Pela crueldade do mundo.

O mundo passa,
Mas não compreende
Que, ao aniquilar o meu corpo,
Me preserva consigo para sempre.

Cai, carinhosa e doce, sobre o meu corpo morto,
E leva nos seus braços a minha alma,
A mensagem da inocência destruída...

O mundo que passe...
Os homens que esqueçam...
A natureza lembrará para sempre!

Mortalitas


10/09/2006

Deusa negra da loucura e do sono infinito,
Que caminhas pelas estradas do mundo,
Arrastando atrás de ti
O sopro de vida dos teus escolhidos,
Indiferente a todos os pedidos de mais tempo
E a quaisquer súplicas por misericórdia...

Senhora sombria do nada eterno,
Que governas a vida para além da vida,
O infinito vazio
Que se segue à existência...

Morte, que passas entre os homens,
Detém os teus passos
E, por um momento,
Dirige para mim o teu olhar vazio.

Enquanto outros te pedem que os poupes,
Eu estou aqui e peço-te que me leves!
Enquanto os homens te imploram mais um dia de vida,
Eu peço-te: nem mais um instante!
Enquanto eles te pedem
Que os deixes viver o que ainda não viveram,
Eu imploro-te,
Ajoelhada perante a tua grandiosa presença,
Que não me obrigues a suportar mais um segundo
Daquilo que vivi.

Eles pedem-te a vida,
O futuro.
Eu peço-te o descanso, o eterno nada,
A morte.
Contudo, quando passas,
Nem te dignas dirigir-me um breve olhar.

Porque me negas?
Se eu te venero, se te adoro...
Se te peço que olhes para mim?
Porque me recusas a tua paz?

Se eles te pedem mais um dia de vida,
Se não entendem como é belo o que prometes,
Então deixa-os ficar, por mais um dia,
Na futilidade da sua vida inútil,
E leva-me a mim,
Que te espero,
Que te quero,
Que te desejo!

Leva-me nas tuas asas de noite
E deixa-me flutuar no vazio!

Deusa negra, amada senhora,
Toda-poderosa morte,
Deixa-os ficar,
Porque eles não sabem como és bela!

Deixa-os, por um momento,
E aceita-me.
Leva-me contigo,
Porque te amo como eles nunca saberão!

Olha para mim...
Estende-me os teus braços...

Leva-me contigo para o infinito!

Tuesday, September 05, 2006

Amo-te

26/08/2006

Amo-te
Com toda a loucura do desespero,
Com toda a angústia de quem sabe que só tem um dia para viver.

Amo-te,
E a minha alma moribunda
Grita o teu nome por entre o estertor da agonia,
Pedindo para te ver.

A meus olhos, és a mais bela obra do criador,
A perfeição presa num corpo mortal.
És tudo aquilo com que eu sempre sonhei,
O amigo que sempre quis ter do meu lado,
O amante que desejei,
O companheiro que idealizei nos meus sonhos.

És igual a mim...
Os teus ideais de vida são os meus.
Tens a mesma forma de ver as coisas mais misteriosas,
Aquele fascínio pelas trevas que o mundo não consegue entender.
Queres apenas viver a vida e ser feliz... como eu.
És igual a mim...
A tua alma é igual à minha
E o teu coração bate no mesmo compasso.

És como eu...

Mas eu,
Que digo que te amo,
Sinto que não te sei amar como mereces.
Eu, que te quero,
Sei que serás mais feliz com outra que não eu.
Eu, que te desejo com todas as minhas forças,
Vejo que nunca encontrarás em mim a felicidade
E desisto de lutar por ti.

Deixo-te partir,
Porque vejo que mereces mais que a minha alma destruída,
Que o meu coração ferido e torturado pelo passado.
Deixo-te,
Porque sei que mereces mais que um amor limitado,
Definido pela indiferença face à vida e o desprezo face ao mundo.
Deixo-te,
Porque sinto que ficarás melhor protegido por outros braços
E, se tu estiveres bem,
Então nada mais interessa.

Vai em paz...
Vai com a certeza de que o meu coração será teu eternamente,
Mas que não será em mim que descobrirás a felicidade.
Vai,
Porque é meu desejo que corras para o teu futuro
E não que fiques, como esta alma quase morta,
Preso ao passado.

Vai... Eu deixo-te partir...
Porque te desejo... E desejo que encontres a felicidade...
Porque te quero... E quero que tenhas a alegria que não te posso dar.
Porque te amo...

...E, por isso, liberto-te.

Destruída


24/08/2006

Quebraste-me,
Como a um barco perdido contra os rochedos da costa,
Como um frágil ramo de árvore que se estendia para o sol,
Como um corpo despedaçado no fundo de um profundo abismo.

Quebraste-me...

Mais impiedoso que o negro anjo da morte,
Desceste sobre mim e lançaste-me na dor.
Reduziste a cinzas os meus antigos sonhos
E abandonaste-me ao vazio da minha vida destroçada.

Quebraste-me,
Com a mesma indiferença com que olhas um monte de lixo,
Com a mesma facilidade com que caminhas a cada dia,
Com a mesma irresponsabilidade com que sempre agiste.

Quebraste-me...

Olhaste para mim e nem sequer me reconheceste,
A mim, alma concebida por ti.
Rejeitaste-me, com um olhar de repulsa,
Como se eu não fosse senão um verme repugnante
Que merece ser pisado.
Abandonaste-me, na aurora da vida,
Para morrer longe de tudo quanto amei.

Quebraste-me...

Quebraste a minha alma
Com a ignorância dos teus actos irresponsáveis.
Cravaste no meu coração
O punhal da tua indiferença e falta de amor.
Transformaste o meu corpo
Num destroço abandonado à fome e à morte.

Deixaste-me no mais estéril deserto,
Para morrer, quebrada e destruída.
Negaste-me toda a esperança de felicidade,
Mas proibiste-me o refúgio de uma morte piedosa.
Abandonaste-me, sozinha neste mundo cruel,
Para viver, para sempre, nas sombras
Do desgosto e da tristeza.

Recusaste-me, depois de morta e destruída,
Caída dos meus sonhos,
E deixaste-me apodrecer em vida,
Para não ouvires de mim
A acusação que ainda assombra o teu espírito,
Que nunca te deixará...

Quebraste-me!

Sempre, Eternamente...

Sempre serena, alma de um sonho antigo,
Que esperavas durar eternamente,
Choras sozinha, à falta de um amigo
Que apague em ti essa dor permanente.

Silenciosa, quase inconsciente,
Indiferente à dor, ao medo e ao perigo,
Lamentas o sofrimento presente
Que todo o mundo abandonou contigo.

Sempre serena, imóvel, impassível,
Observando a barreira intransponível
Que te afasta de tudo quanto amaste.

Calma, como se o tempo não passasse,
Como se a eternidade te deixasse
Esquecer a vida que um dia sonhaste!

Filho da Noite

Meu doce anjo, memória desta vida,
Em meu nome caído da inocência,
Dorme na luz da tua inconsciência,
Que eu velarei tua alma destruída.

Filho da noite, da noite perdida
Da angústia sem socorro ou assistência,
Fecha os olhos e deixa a consciência
Fugir de ti para a minha alma esquecida.

Meu pequenino, luz dos meus momentos,
Dorme, que eu velarei teus sentimentos,
E deixa-te embalar pela doce luz.

E, se a morte te chamar em segredo,
Abre os teus braços e não tenhas medo,
Que eu ficarei para suportar tua cruz!

Sacríficio

Arrastei-me entre as sombras do passado
Durante anos de dor e de agonia,
Pedindo aos deuses da noite sombria
Que essa dor redimisse o teu pecado.

Sofri a angústia de um corpo magoado,
De uma alma ferida, para sempre vazia,
Dando o sacrifício de cada dia
Para que pudesses ser libertado.

Durante mais anos que a eternidade,
Renunciei à minha liberdade
E em mim tomei tua dor, fria e serena.

Mas, cansada, levanto-me da lama,
E, erguendo os braços ao céu que me chama,
Entendo que, por ti, não vale a pena!

Ancestral

Com toda a devoção que era devida
À tua suposta superioridade,
Respeitei tua presença e tua vontade
E dediquei-te toda a minha vida.

Como a uma divindade enaltecida,
Adorei-te, na imensa eternidade,
E vi em ti a perfeita verdade
Da antiga sabedoria esquecida.

Representavas, meu antepassado,
Uma força superior, um legado
De alta sabedoria incontestada.

E eu, cega por aquilo que sentia,
Pus em ti toda a esperança de alegria
E amei-te, mas tu não valias nada!

Campo de Lamentos

Ainda choro a infância destruída
Em que todos os sonhos se apagaram,
Perdidos nas memórias que ficaram,
Incapazes de dar sentido à vida.

Ainda lamento a criança perdida
Na solidão das trevas que restaram,
Dos sonhos vãos, que outros ventos levaram
Para longe da esperança destruída.

Ainda magoa a memória sombria
Daquele grito de vida vazia,
Lançado, em desespero, aos quatro ventos.

Eu sou a inocente condenada,
Que se arrasta, ferida e destroçada,
Entre as cinzas de um campo de lamentos!

Semper Tuam

Fugiu no vento o afecto que te dei.
O amor que te tinha, a mágoa levou.
Tudo o que quis, o meu tempo, apagou.
Arderam os sonhos que imaginei.

Perderam-se as forças com que te amei.
A minha vida, o ódio a destroçou.
Meu ser morreu. Meu coração quebrou.
Desfez-se em cinzas tudo o que sonhei.

Hoje sou só uma sombra vazia,
Espectro vazio de uma vida sombria,
Cinza perdida, varrida para a rua.

Mas se, um dia, o meu sonho renascer
E o fogo que morreu voltar a arder,
Garanto que essa chama há-de ser tua!